quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

A maldição de Ondina

Quem nunca tentou segurar ao máximo a respiração para ver até o quanto suportaria? Debaixo da água então eu mesmo já fiz várias vezes, mas chega num momento que nossa cabeça parece que vai explodir que nem um balão e acabamos soltando o ar dos pulmões para respirarmos novamente. Isso ocorre devido aos mecanismos de respiração involuntária que temos. Graças a eles, a gente permanece respirando mesmo quando não estamos conscientes dessa necessidade, como na hora do sono. Mas e se não fosse possível ter controle próprio da respiração e precisássemos estar alerta para fazer o processo de ventilação pulmonar durante 24 horas por dia, incessantemente? Esse é justamente o drama vivido por aqueles que são acometidos pela maldição de Ondina.


(Fonte: oestrogenio)

Também conhecida como síndrome de Ondine ou hipoventilação alveolar primária, as pessoas que sofrem desse problema simplesmente perdem o controle da respiração, ou seja, se o indivíduo não estiver atento pode simplesmente esquecer de respirar e morrer sufocado!
A palavra Ondina ou Ondine faz referência à ninfa das águas, segundo a mitologia germânica, e a síndrome que leva seu nome foi descoberta a cerca de 30 anos atrás. Hoje se acredita que há pelo menos uns 400 casos conhecidos, mas na realidade esse número pode ser bem maior já que a maioria dos bebês que nascem com essa síndrome tem morte súbita e, geralmente por falta de conhecimento dos médicos, são diagnosticados erroneamente ou simplesmente morrem sem ter uma causa determinada.


Ventilação mecânica durante o sono (Fonte: pamellafisio)

A doença é causada por mutações em genes, sendo que a mutação do gene PHOX2B é a principal responsável. Geralmente a síndrome é presente em recém-nascidos, mas indivíduos heterozigotos para PHOX2B podem desenvolver formas mais leves da doença e chegarem até a fase adulta. Entretanto, o maior perigo está mesmo na fase do sono, pois o fato do indivíduo não respirar adequadamente pode ser fator de risco para enfermidades cardiovasculares e cerebrais, sendo que, os problemas mais freqüentes durante e após o sono são o infarto agudo do miocárdio e o acidente vascular cerebral, sem falar nas lesões isquêmicas arteriais irreversíveis causadas pela diminuição do fluxo sanguíneo cerebral, por falta de ventilação na região. Geralmente os casos mais graves exigem um suporte de ventilação mecânica 24 horas por dia e, em alguns casos, uma cirurgia para a adição de um marca-passo frênico, mas é uma intervenção muito rara, pois é de elevado custo e existem pouquíssimos hospitais no mundo que fazem esse tipo de cirurgia.


(Fonte: humorsafado)

A maldição de Ondina é de difícil diagnóstico, devido a sua baixa incidência. Nos casos mais antigos da doença, os pacientes apresentavam diversos graus de atraso no desenvolvimento psicomotor, no crescimento estrutural, quadros convulsivos com seqüelas devido aos episódios de hipoxemia (deficiência anormal de concentração de oxigênio no sangue arterial) entre outros. Atualmente essas seqüelas vêm diminuindo graças à evolução da medicina, onde a doença pode ser diagnosticada precocemente, e ao suporte domiciliar intensivo de 24 horas, onde o paciente é acompanhado por especialistas. Além disso, o suporte de ventilação mecânica sofreu muitas melhorias e algumas opções adicionais para o tratamento do paciente, apesar do prognóstico se limitar a complicações do uso prolongado da ventilação mecânica. É importante destacar que em uma família mais pobre, um tratamento adequado da doença se torna inviável, principalmente pelo fator do alto custo e do esclarecimento da família do indivíduo, levando em conta que a equipe que faz o acompanhamento do paciente deve ser formada por cardiologista, neurologista, otorrino, endócrino, gastro, oftalmo, pneumologista, psicólogos, terapeutas, fonoaudiólogos, enfermeiros, assistente social e nutricionista. Além disso, a família necessitará de treinamento específico para cuidar do doente que precisará ou não de suporte de ventilação invasivo e de monitoração com oximetria (avaliação do grau de oxigenação sanguínea) e capnografia (avaliação do gradiente de dióxido de carbono durante a expiração), pois o paciente pode não apresentar sinais clínicos de esforço respiratório perante uma situação de comprometimento do sistema respiratório.


Paciente com síndrome de Ondina, acompanhada por especialista (Fonte: 1m1f)

A maioria dos casos de síndrome de Ondina é do tipo moderado, sendo que, pouquíssimos casos considerados graves foram registrados.
Ao refletir sobre isso é difícil imaginar como seria a rotina de uma pessoa que sofre desse mal, principalmente na hora do sono. Talvez eu me lembre disso da próxima vez que prender a respiração debaixo da água.

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